Semana passada, lá na cidade do Rio de Janeiro, aconteceram dois grandes eventos internacionais: Na Rio+20 – conferência da ONU para o meio ambiente – estiveram governos, ONG´s, figurões do mercado e cientistas do mainstream.
olhos voltados pro Brasil |
Do
outro lado da Cidade Maravilhosa, na Cúpula dos Povos estavam reunidos
movimentos sociais como a Via Campesina, que articula camponeses ao redor do
mundo. Estiveram também comunidades tradicionais como pescadores, quilombolas,
e ribeirinhos. Povos Nativos de toda a América. Estavam lá vários grupos de
economia solidária, permacultores, artistas... Gente do mundo inteiro.
Cada
um dos eventos discutiu suas prioridades.
Na
conferência da ONU, o centro dos debates girou em torno da chamada “economia
verde”. Reconhecendo o fato de que “é, estamos F****do o planeta” os engravatados
lá reunidos chegaram a algumas conclusões – reunidas em um documento que “reafirma
o mercado internacional como mecanismo para o desenvolvimento e crescimento
econômico e também reafirma que um mercado justo – e significantemente
liberalizado pode beneficiar países em desenvolvimento ao redor do mundo
através do desenvolvimento e crescimento econômico em seu rumo ao
desenvolvimento sustentável.”
a cara de quem esperava algo da Rio+20 |
Estimulando
a economia verde: pacotes tecnológicos com selos de sustentabilidade – com o aval
da organização para aplicar as regras de mercado aos bens e serviços
ambientais. Agora tudo tem preço.
Enquanto
isso, na Cúpula dos Povos, as organizações, os povos tradicionais e
ambientalistas das várias matizes discutiam como resistir à expansão do mercado
sobre territórios, com as cercas multiplicando-se e os bens comuns escasseando.
Em Anchieta a CSU é a irmã gêmea da CSA |
Apontando
a “economia verde” como mais um espasmo de um moribundo em busca do ar que lhe
falta a Carta dos Povos diz que “A Rio+20 repete
o falido roteiro de falsas soluções defendidas pelos mesmos atores que
provocaram a crise global. À medida que essa crise se aprofunda, mais as
corporações avançam contra os direitos dos povos, a democracia e a natureza,
sequestrando os bens comuns da humanidade para salvar o sistema
economico-financeiro.”
Ora, e o que essa carta – aprovada no meio do que talvez seja
a maior crise financeira registrada nessa história do Ocidente – tem a ver com
o Espírito Santo? Vou tentar explicar de forma simples.
Pensa assim: O Espírito Santo tem um território. Nesse
território habitam pessoas. Muitas delas ainda dependem exclusivamente desse
território para subsistir, para viver, para sobreviver economicamente. Ligados a
uma sabedoria que remonta gerações anteriores na lida com os recursos dessa
Terra.
homem: espécie ameaçada. |
E se uma empresa comprasse (ou ganhasse, como é freqüente no
estado mais pobre da região mais rica do Brasil) uma parte desse território. Então
com o pretexto de “desenvolvê-la”, construísse uma cerca, um porto, uma
siderúrgica, plantasse tudo de eucalipto, explodissem os morros todos, enfim, essas
coisas que agente faz para desenvolver esse estado pobre em recursos naturais,
hídricos, paisagísticos, naturais...
Bom, não se faz omelete sem quebrar os ovos. Todo mundo sabe
disso no Espírito Santo – por isso o convívio pacífico com siderúrgicas junto
de bairros nobres, portos em áreas tradicionais de pesca, comprometimento de
recursos hídricos para atender grandes plantas industriais...
Pois bem. Há de se sacrificar parte desse território que
usufruíamos para reproduzir práticas sociais, culturais, religiosas herdadas
dos que vieram antes de nós. Desenvolver é o imperativo moderno. É por isso que
agente sacrifica algumas centenas de milhares de hectares das terras
agricultáveis mais férteis do nosso Estado para uma empresa cujos donos sequer
moram aqui no Espírito Santo...
Tudo bem, até aí nenhuma novidade. Tá, pode ser o pano de
fundo que levou ao cenário Cúpula dos Povos X Rio+20. Mas o pulo do gato é a
participação da delegação capixaba lá, na conferência da ONU. Com um projetinho
embaixo do braço, ó que bonito, chamado “Reflorestar”.
Parênteses: há uns anos atrás um executivo da antiga Aracruz
Celulose (atual FIBRIA) fez uma aposta errada: apostando a expectativa de
rendimento, do rendimento especulativo de seu lucro previsto (eu sei que é
complicado, mas é o terceiro passo da financeirização – você recebe um dinheiro
empenhando a perspectiva de ganhos do seu lucro já aplicado financeiramente)
ele quebrou a cara: contraiu o financiamento em dólar, a economia ruiu e a
empresa perdeu 4bilhões de reais. Se salvou da falência abrindo sociedade e se
tornando a Fibria.
Todos nós sabemos do processo conflituoso de instalação da
Aracruz Celulose – em plena ditadura militar – no norte do Espírito Santo.
Grilagem, poluição, esgotamento de recursos hídricos... Enfim, comprometimento
do território.
Acontece que o negócio deles, pasmem, é plantar floresta! E
plantando floresta, eles também podem acessar esses recursos disponibilizados
via mercado para o pagamento de serviços ambientais. Então, surfando na crista
da onda da economia verde, a papeleira já recebe créditos de carbono – por plantar
florestas para combater o aquecimento global!
Economia Verde |
Não bastasse a empresa comprometer esse território – passível
de inúmeros outros usos, que gerassem mais emprego, menos impacto, maior
distribuição de renda (depois olha os índices que compõem o IDH de Aracruz pls)
– o Governo que é sustentado com o seu imposto decide que o trabalho deles
plantando floresta é tão bom, mas tão bom, que agora vai financiar mais gente pra
plantar mais floresta! E viva a economia verde!
Esse aí é o resuminho na prática: a ONU dando o aval para o
contínuo processo de acumulação predatório aqui debaixo do equador pra salvar
os capitalistas lá de cima que tomam decisões erradas. Mas o que faz cair o
queixo mesmo é a atuação de governos governotes e governinhos, sem o menor amor
pela Terra, defendendo com tanta vontade (e políticas públicas) o lucro desses
engravatados que não moram aqui.
E as suas decisões erradas, quem vai consertar Casagrande?
Ou se muda a política ambiental vigente nesse Estado ou vamos estar para sempre condenados a comprometer mais território NOSSO para garantir o Lucro de Transnacionais.
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Espírito Santo - Fazendo a sua parte! |
Se um dia o petróleo do pré sal vazar, se um dia o minério cair de preço, se um dia outro engravatado tomar uma decisão errada e falir um empreendimento desses e te largar com o pepino na mão, a quem você vai apelar, pra desfazer a merda feita? Ao mercado?
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E a gente, como fica? |